sábado, 13 de junho de 2009

A solidão é a única companheira das horas vagas.
Navego em mim mesmo e desembarco no meu porto abstrato.
O mar das ilusões se faz calmo e tudo o que antes era tormento se desfaz
como um laço de matrimônio
Meu batismo foi sacramentado na esperança, que agora se torna paz
Sou meu barco e meu abrigo
Minha vela acesa e meu tormento
Minha angústia e desespero
Sou pirata de mim mesmo
Ateu dos meus próprios sonhos
Estou só e isso me basta
Nem choro, nem sorriso, estou inerte
Tal qual as águas mansas, viajo sem direção
Abstraio a realidade
Sou feliz por ser eu.
Me inspiro e me navego
Me exploro e me descubro
E no fim, só os versos me consolam.

Bruno Sampaio.

segunda-feira, 8 de junho de 2009

Geralmente, de noite, é difícil se ter algo de interessante para comer, aqui em casa. Quando não preparo algo ao meu gosto, ou quando não vou comprar algo no mercantil, passo na casa da minha avó, porque lá é garantia de boas comidas e de guloseimas para o querido neto aqui. Sempre foi e sempre será assim. Até a carne da minha avó é diferente, é mais macia, mais suculenta, mesmo que não seja de primeira qualidade.

Decidi que iria comprar uma lasanha no mercantil e fui lá. Costumo dizer que nasci para ser grávida ou velho: detesto pegar fila e, a contragosto meu, era isso que tinha, de sobra, no mercantil: filas e mais filas. Até o caixa rápido estava lento, enfim. Desisti da idéia do mercantil e fui pra minha segunda opção: a casa da minha avô (anteriormente, minha tia tinha me ligado dizendo que a geladeira estava abarrotada de coisas boas. Aposto que foi só pra "bulinar" na minha pobre alma de ex-obeso-sedento-por-coisas boas).

Chegando lá, tinha uma amiga e um amigo do meu avô que moram em Portugal e que foram fazer uma visita ao velho poeta. Entrei, cumprimentei todos e segui logo pra cozinha, pra ver o que tinha de bom e "fazer logo o meu mercantil", gratuito, nesse caso.

Quando eles estavam saindo, fui junto. Nas despedidas, estavam falando de poesia e meu avô soltou essa:

"Depois de cego, eu pedia pra Solange ler alguns dos meus livros pra mim e tinha a certeza de que aquilo não tinha sido eu que tinha escrito. Quando eu escrevia, eu sentia que era uma inspiração de fora que vinha, algo que incorporava, não sei explicar."

Eu achei isso absurdamente lindo e inspirador. Não inspirador pra mim, mas sei lá, a situação em si é inspiradora. Até porque eu nunca percebi que nada incorporava em mim quando eu escrevia.

Na verdade, quando leio alguns textos escritos há um tempo, fico surpreso, acho bonito, acho muito lindo, pra falar a verdade, me surpreendo com aquilo que escrevi e, às vezes, chego a pensar que não fui eu que escrevi. Tá, não que eu queira ser O POETA, como meu avô é, mas é bem isso que eu sinto.

Por outro lado, quando leio alguns outros textos que escrevi, chego a pensar que sou um patético escritorzinho chulo que pensa saber brincar com as palavras e com os sentimentos e, com isso, imagina que as futilidades que escreve podem tocar alguém. Lógico que esse é o objetivo: tocar alguém, mesmo que esse alguém seja eu.

É estranho. Talvez eu possa ser um meio-escritor, ou um fanfarrão qualquer que pensa saber escrever, mas não sei. Aliás, se tem algo que não tenho domínio é da língua. Gramática, assim como física moderna, são assuntos que nunca tive domínio. Já disseram que é quase um Patativismo do Assaré, já disseram que lembram Clarice, já disseram que tenho minha personalidade própria, enfim, só sei de uma coisa: nunca chegarei aos pés do meu avô, de quem sou fã. Não é pra qualquer um ter Carlos Drummond em um dos prefácios de seus livros, ou trocar cartas com Jorge Amado.

E o engraçado disso tudo é que ele não se sente capaz de ter seus livros publicados. Sempre se recolheu ao ambiente familiar e suas artesanais publicações só chegaram às mãos de filhos e amigos, embora se tenha notícia de que algumas dessas obras têm cópia em uma biblioteca de Nova Iorque.

Mas fica aqui o objetivo, agora registrado: eu vou publicar, mais cedo, ou mais tarde, as obras do meu avô.

(Ah, e se alguém quiser ler alguma poesia dele, é só pedir, nos comentários, que eu coloco)

:)
Estava cansado de tudo aquilo. A realidade era triste e repetitiva. Era tudo tão igual, tão debilmente igual. Não eram ciclos que se repetiam, mas pontos, pontos únicos. Era um alucinante dejavu frenético. Nada mudava. As piadas, as figuras, as melodias, tudo era tão superficial e patético. Só mudavam as máscaras, tão superficiais como quem delas fazia uso.
A vida limitada àquilo me incomodava. Era como um soco num estômago que não era meu, mas que eu acabava sentindo, por eu ter feito parte de tal organismo decomposto. Como achar que a felicidade poderia ser encontrada ali? E até podia, mas era rara. Tão rara como encontrar um lapso de cultura em meio a uma multidão de alienados, que teimavam em fazer o complexo mecanismo da repetição se repetir.
E se repetia sempre, com as máscaras de sempre, os bobos-da-corte de sempre (com suas piadas sem graça de sempre) e os reis de sempre, que apoiados na tolice de seus tolos súditos, reinavam felizes, com a suposta e irreal "felicidade" repetida, imposta.

Bruno Sampaio.

quinta-feira, 4 de junho de 2009

Porto de papel

Por gentileza, uma dose de silêncio.

Quero afogar meu pranto e derramar a ira que agora sinto

A tristeza de outrora se esvai, se dissipa como todo sentimento que dentro de mim exista

Só resta rancor, infiltrado, intimamente enlaçado a tudo que me lembra o que vivi

O porto, que antes se dizia seguro, não é mais que um reservatório, um pote, um balde rachado

E minha navegação de papel já não é seca, já não navega

É molhada e afogada, destruída

Transtornada como o amor.

Sentimentozinho pífio, que não consola, só maltrata.

Laços viciosos, consequências tenebrosas e finais sombrios

Diferente do amor, o reconforto da vitória

Os recomeços de alegria.


Bruno Sampaio

terça-feira, 2 de junho de 2009

Ela

A conheci em meus tempos de escola, faz um tempo considerável. Minhas cãs ainda não haviam despontado e minha pele ainda tinha uma consistência saborosa. Conseguia enxergá-la tão bem, por vezes, me sentia uma águia, conhecia, praticamente, todos os poros da pele dela, além da medida precisa de todos os fios de cabelo (eu sempre admirei seus cabelos longos, castanhos, e sempre fiz questão de acariciá-los, como se com um toque meu, eles se tornassem mais brilhosos e minha vida mais ilumidada). Todos os detalhes, todos os vícios, tudo que ela fizesse me parecia grandioso.
Logo nos tornamos cúmplices. Era um amor sem atração, ainda que bem atraído e junto.
A confiança não tardou a vir, nem os risos, as confidências. Ela tinha o dom de transformar cada momento sacal no mais interessante e apaixonante momento. Eu, sempre péssimo em gramática, me sentia o invetor do latim, quando estava do seu lado.
Era mágico e ela sabia tornar sublime. Eu a amava. Mas nunca passou de amor. Acho que nem tinha como passar. Não queria possuí-la e nem a queria longe, ao meu lado era sempre o melhor local. Não gostava de dividí-la com amigos. Ficava bobo e queria que minhas piadas sempre fossem as mais engraçadas, para que eu pudesse ver aquele brilho metálico do seu aparelho, que, tempo depois, foi removido.
E cada um tomou seu rumo. Ela, sempre decidida, foi em busca de seus sonhos. Eu, indeciso e sem ela, patinei em algumas coisas, testei algumas outras. De certeza mesmo, só a que eu a amava. E sabia que ela me amava. Pra mim era tão claro. Com um olhar, eu sabia que ela precisava de mim, dos meus conselhos, do meu ombro. Sempre fui muito agitado, mas ela confiava em mim. Ela confiava em mim mais do que eu mesmo. Durante esse tempo todo, ela me deu sabor à vida. E depois de tanto tempo, tanto tempo, percebo que ela é tão importante pra mim quanto minha esposa, ou quanto os meus filhos, que lógico, a chamam e a têm como tia (por parte de pai, porque ela é mais que uma irmã pra mim). Nela vejo a representação da amizade e chorando, com as mãos tremendo (ela que diagnosticou meu Parkynson e que me apoiou durante toda minha adaptação à doença), tento arranjar alguma forma de homenageá-la, mas não consigo. Tudo o que eu fizer é pouco diante do que ela representa pra mim. Ela é mais do que tudo o que eu possa escrever, é superior a qualquer metáfora que minhas mãos possam desenhar. Ela é assim e nada que eu venha a escrever a retrata da melhor forma. Talvez com um abraço apertados, do jeitinho que ela sabe que eu gosto, eu consiga transmitir alguma coisa. Escrevendo não, eu não sou capaz, e, ainda assim, ela adora as bobagens que escrevo.

Pequena homenagem a uma grande pessoa na minha vida. Ela, realmente, sabe ser e sabe o tom da nossa amizade. Uma das minhas grandes amizade e um dos meus grandes amores.

:)